segunda-feira, 21 de julho de 2008

"CRIME EM LINDA-A-VELHA CITY" - CAPÍTULO 36

CAPÍTULO 36
INCLINADO NAS TARDES LANÇO AS MINHAS TRISTES REDES
AOS TEUS OLHOS OCEÂNICOS

"O internacionalismo consiste na solidariedade fraterna dos operários de todos os países na luta contra o jugo do capital"
Lenine

No capítulo anterior, JC e Tatiana decidiram dirigir-se para um bungalow, tendo ficado por identificar as razões de tal propósito.
Já no recato da cabana, instalada no areal e sob os grandes coqueiros e palmeiras, características de Linda-a-Velha City, JC põe a tocar o Bolero de Ravel.
- Oh JC, se pensas que vamos f… a ouvir essa merda é porque apanhaste muito sol na tola! – insurge-se Tatiana.
- A música é bestial. É do melhor que já se fez – responde JC.
- Recordo-me de ter lido algures que essa merda é “a monstruosidade mais insolente perpetrada na história da música. Do princípio ao fim dos seus 339 compassos, é simplesmente a repetição incrível do mesmo ritmo e, acima de tudo, o recurso ruidoso de uma melodia de cabaré esmagadoramente vulgar, que é um pouco do lamento de um gato desregrado de uma qualquer viela das traseiras”.
Não conseguindo encontrar o VJ/DJ Slow Down, para confirmar ou infirmar a tese de Tatiana, JC cede à reclamação, pressiona o “stop” da aparelhagem de som e é assim, sem qualquer música a quebrar o silêncio, que eles se amam loucamente, aventurando-se sem tabús nos mistérios dos seus corpos.
Muitas horas depois, os dois amantes abandonam a cabana e deixam-se cair no manto de areia, gozando os últimos resquícios de calor. E ficam, abraçados, saboreando a brisa marítima.
- Olha lá, Tatiana, as tatuagens no teu corpo deixam-me louco, mas a que há pouco descobri na tua púbis é o máximo…
- Gostas? É a serpente emplumada, Quetzalcoatl. Tatuei-a em honra de um antigo namorado mexicano, estudioso da civilização azteca.
- E todos os teus namorados tiveram direito a tatuagem? – pergunta JC, evidenciando uma ponta de ciúme.
- Todos não, só aqueles que foram capazes de levar o meu espírito a libertar-se do corpo, a atingir o nirvana. E foram poucos…
- Quatro, pelas minhas contas…
- Tens razão. O teu olhar é muito acutilante. Os caracteres japoneses na omoplata significam Monte Fuji, por causa de um namorado nipónico, que era um vulcão na cama. O golfinho no tornozelo foi inscrito para celebrar um antigo amante que se dedicava à arqueologia marinha.
- Então e a borboleta na nádega?
- Essa recorda-me outra grande paixão, um matemático chinês que escreveu um tratado sobre a teoria do caos. Estava num bar em Pequim e ele dirigiu-se-me dizendo: “O bater das tuas asas de borboleta tem o efeito de um tufão no meu ritmo cardíaco”. Foi amor à primeira vista…
- Será que um dia ainda vais tatuar-me, ou eu sou apenas um amante fugaz na tua intensa viagem pelo universo?
- Jamais te esquecerei, meu querido JC. Já estás irremediavelmente tatuado nas profundezas dos meus ventrículos.
- E posso ver?
- Não sejas tonto! Essa tua ingenuidade parte-me o coração.
A Tatiana é uma rapariga esperta e saiu-se bem do imbróglio. Talvez um dia JC venha a confirmar a veracidade da informação. Se for convidado para a autópsia…
- JC… - chama de mansinho Tatiana.
- Diz-me, doce ucraniana.
- Não quero que existam segredos entre nós.
- Conta-me tudo, meu amor.
- Eu não sou ucraniana. Nasci em Cuba. O meu pai é paraguaio e a minha mãe é russa, naturalizada chilena.
- Foi a isso que, verdadeiramente, Lenine chamou internacionalismo, eh, eh, eh.
Tatiana explica tudo a JC. O seu pai vivia na capital do Paraguai, Assunção, em condições muito difíceis, numa pobreza quase absoluta. Teve uma filha, que morreu de poliomielite infantil.
Os progenitores tentaram ultrapassar esse desgosto gerando uma nova criança, mas esta e a mãe morreram durante o parto.
Nessa altura, o pai estava desempregado, tinha sido despejado, por impossibilidade de pagar a renda da casa. Uma barraca nos subúrbios foi o tecto possível.
O pai, sozinho no mundo, toma consciência da necessidade de lutar por melhores condições para a classe trabalhadora e adere ao PC.
Mas, com a chegada ao poder de Alfredo Stroessner, em 1954, e o início de um longo período ditatorial, ele busca asilo político na União Soviética.
- Porra, meu amor, o teu pai era comuna?
- Já não gostas de mim?
- Claro que gosto, minha querida. Só não gosto é de comunas. As filhas boazonas deles até chupo. Mas como é que foste nascer em Cuba?
- Lembras-te da Crise dos Mísseis, quando os soviéticos instalaram mísseis nucleares em Cuba, em 1961? Foi o meu pai que os levou para lá.
- Era militar?
- Não, meu amor, trabalhava no cargueiro que fez o transporte.
Tatiana continuou a explicação. O pai acabou por fixar residência em Cuba. E encontrou emprego num hotel. Certa altura, o progenitor ouviu, quando estava de serviço, uma conversa entre dois agentes da CIA e percebeu que se preparava um atentado contra Fidel Castro.
Ele avisou El Comandante e este premiou-o com o recrutamento para a G2, a agência de espionagem cubana.
O pai de Tatiana é colocado na embaixada de Cuba, no Chile, como adido cultural, mas quando Pinochet e a sua junta militar assumem o poder, em 1973, ele regressa a Cuba. Mas não sozinho.
Leva consigo a namorada, uma bela mulher de Moscovo, que se havia naturalizado chilena e que vivia em Valparaíso, na vizinhança de Pablo Neruda.
Um dia, estavam o poeta e o futuro pai de Tatiana em conversa, saboreando um rum velho e um Cohiba, na varanda da vivenda de Neruda, debruçada sobre a baía de Valparaíso.
Aquela que viria a ser a mãe de Tatiana cumprimenta da rua Pablo Neruda e afiança:
- Este é o melhor pôr-do-sol do mundo, não acham? Esta foi uma das razões por que abandonei Moscovo, a minha cidade natal.
Logo ali, o pai de Tatiana fica rendido à voz doce da rapariga. E aos outros atributos visíveis a olho nu. Jura, um dia, casar com ela. Pablo Neruda haveria de aceder ao pedido do amigo e apresentar-lhe a rapariga.
E foi com um poema de Neruda que o pai de Tatiana se viria a declarar à futura mulher:
“Inclinado nas tardes lanço as minhas tristes redes
aos teus olhos oceânicos.
Ali se estira e arde na mais alta fogueira
a minha solidão que esbraceja como um náufrago.
Faço rubros sinais sobre os teus olhos ausentes
que ondeiam como o mar à beira dum farol.
Somente guardas trevas, fêmea distante e minha,
do teu olhar emerge às vezes o litoral do espanto.
Inclinado nas tardes deito as minhas tristes redes
a esse mar que sacode os teus olhos oceânicos.
Os pássaros nocturnos debicam as primeiras estrelas
que cintilam como a minha alma quando te amo.
Galopa a noite na sua égua sombria,
derramando espigas azuis por sobre o campo.”
- Eu sou fruto dessa relação apaixonada. Os meus pais casaram, eu nasci, o meu pai morreu pouco tempo depois. A minha mãe, bastante mais jovem, criou-me sozinha.
Consegui ser admitida na Academia Militar e, mais tarde, fui recrutada para a G2 e tornei-me espia.
- Mas que grande história. Estou verdadeiramente pasmado. E não me dizes o que te trouxe a Linda-a-Velha City?
- Os serviços secretos de Cuba descobriram que a Espanha tinha concebido um plano para invadir o Panamá, ainda por cima com a ajuda da Killing Quickly, Inc. Esta tinha estado envolvida na operação “Magusto”, para a invasão de Cuba.
- Aquilo da Baía dos Porcos, não é? Já ouvi falar…
- Como sabes, El Comandante não vai muito à bola com os espanhóis, os sacanas dos colonizadores de Cuba, e odeia os americanos, além de ter uma imensa admiração pelos valorosos panamenses.
- Ah sim? Mas porquê?
- Fidel Castro é um dos 34 Chefes de Estado entronizados como cancelários da Confraria do Vinho do Porto. E ele acha que, se os castelhanos invadirem o Panamá, vão transformar este magnífico vinho em xerez.
- Então o teu chefe grama vinho do Porto?
- Mais que gramar, como costuma dizer no seu círculo mais próximo, ele “granma” a bebida. Tás a ver em que nível é que ele coloca o vosso símbolo nacional… E só fuma um puro Cohiba com um cálice de vinho do Porto. Imaginas El Comandante a beber xerez?
- Pois não, isso seria mesmo muito pindérico!
- Foi por isso que ele me destacou para Linda-a-Velha City, incumbindo-me da missão de ajudar os valentes honoráveis capitães, embora de forma discreta. Mas ainda não te contei todos os meus segredos… Ainda falta um. E é esse que me levará a perceber, em definitivo, a dimensão do teu amor…
Bolas, bolas, bolas! Mas que raio de segredo é que a rapariga ainda consegue esconder? É um verdadeiro poço de mistérios… Vou ali ao fundo do poço e já venho. Conto tudo no próximo capítulo.
TO BE CONTINUED…

7 comentários:

Anónimo disse...

Boa, Man’el.
Estive 15 dias de férias e quando cheguei tinha 6 capítulos para me por em dia com a vida do JC.
Porreiro, pá.

MANUEL JESUS disse...

Só faltava chegares de férias e o Governo ter caído... Isso é que era porreiro, pá!

Anónimo disse...

Agora deu-te para poesia lamechas?
“Inclinado nas tardes…blá, blá, blá”
Ai, ai, ai.
Vê se aprendes com E. M. de Melo e Castro

Autobiografia fenómeno-F(re)udiana

fui chulo dancei a chula
fui lira dancei o vira
fui drogas comi doutoras
fui tinta mijei tinteiro

só não fui é paneleiro

fui minas chupei meninas
consumi os 3 de vez
entortei cornos que fiz
ganhei e perdi dinheiro

só não fui é paneleiro

fui língua cantei o tango
fui fraco fodi o frango
fui marido fui comido
no mastro do meu veleiro

só não fui é paneleiro

fui punho bati punheta
fui alho chupei alheira
fui corno toquei corneta
fui vivo virei viveiro

só não fui é paneleiro

trinquei as mamas às amas
toquei árias às canárias
virei as telhas às velhas
comi putas sem dinheiro

só não fui é paneleiro

e de tudo o que já fui
a pena me dá no cu
de prazer tão verdadeiro

só não sou é paneleiro.



Vê se deixas de ser aquilo que não foi, nem é, Ernesto Manuel de Melo e Castro, pai da desenxabida da Eugénia Melo e Castro.
(Com genes tão bons, como é que saiu tão fraquita a rapariga?)

Anónimo disse...

Olá meus queridos, meus amores.
Olá Bimbinha ;)

Vomidrine, meu bem, grande poema. Esta malta da Covilhã é mesmo catita. Que saudades da minha passagem pela Universidade da Beira Interior.
Viva a UBI. Hip, hip, hurra!
Já agora, vocês sabem como é que se chamava a directora do curso de psicologia? Graça Proença Esgalhado. Ah, ah, ah… Proença Esgalhado. Que maravilha!
Então, especialmente para vocês, aqui vai uma poesiazinha do Guerra Junqueiro que foi incluída na minha tese de mestrado sobre a importância do tamanho.

A Torre de Babel ou a porra do Soriano

Eu canto do Soriano o singular mangalho!
Empresa colossal! Ciclópico trabalho!
Para o cantar inteiro e para o cantar bem
precisava viver como Matusalém.
Dez séculos!

Enfim, nesta pobreza métrica
cantemos essa porra, porra quilométrica,
donde pendem colhões que idéia vaga
das nádegas brutais do Arcebispo de Braga.

Sim, cantemos a porra, o caralho iracundo
que, antes de nervo cru, já foi eixo do Mundo!
Mastro de Leviathan! Iminência revel!
Estando murcho foi a Torre de Babel
Caralho singular! É contemplá-lo
É vê-lo teso!
Atravessaria o quê?
O sete estrelo!!

Em Tebas, em Paris, em Lagos, em Gomorra
juro que ninguém viu tão formidável porra
É uma porra, arquiporra!
É um caralhão atroz
que se lhe podem dar trinta ou quarenta nós
e, ainda assim, fica o caralho preciso
para foder a Terra, Eva no Paraíso!!

É uma porra infinita, é um caralho insone
que nas roscas outrora estrangulou Laoccoonte.

Oh, caralho imortal! Oh glória destes lusos!
Tu podias suprir todos os parafusos
que espremem com vigor os cachos do Alto Douro!
Onde é que há um abismo, onde há um sorvedouro
que assim possa conter esta porra do diabo??!
O Marquês de Valadas em vão mostra o rabo,
em vão mostra o fundo o pavoroso Oceano!
– Nada, nada contém a porra do Soriano!!

Quando morrer, Senhor, que extraordinária cova,
que bainha, meu Deus, para esta porra nova,
esta porra infeliz, esta porra precita,
judia errante atrás duma crica infinita??

– Uma fenda do globo, um sorvedouro ignoto
que lhe dá de abrir talvez um dia um terramoto
para que deságüe, esta porra medonha,
em grossos borbotões de clerical langolha!!!

A porra do Soriano, é um infinito assunto!
Se ela está em Lisboa ou em Coimbra, pergunto?
Onde é que ela começa?
Onde é que ela termina
essa porra, que estando em Braga, está na China,
porra que corre mais que o próprio pensamento
que porra de pardal e porra de jumento??
Porra!

Mil vezes porra!
Porra de bruto
que é capaz de foder o Cosmo num minuto!!

Beijos, beijos. Até à próxima.

MANUEL JESUS disse...

Só tenho um comentário a fazer: Porra! Este blog está com um nível cultural do cacete!
Ok, pronto, viva a UBI! Pensei que para aqueles lados só se esquiava...

Anónimo disse...

Muito bem.... a Claudinha Docinho já está muito avançada na sua tese. Parece-me uma rapariguinha muito aplicada, danadinha para o estudo. Afinal, já chegaste a alguma conclusão, ou ainda precisas de mais material??....

Anónimo disse...

Anónimo meu bem, o material é sempre bem-vindo. Tinha uma amiga que dizia que sexo é como uma pizza. Se é bom é muito bom, se não é, é bom na mesma.
O menino não tem andado por aqui, por isso não sabe das novidades. Já entreguei um rascunho da tese ao meu orientador (ver comentário no capítulo 35). Quanto a conclusões, adoptei a teoria do querido Vomidrine (ver comentário a "A Casa do Cara**o") que sabiamente discorre assim:
«Não somente a maioria das mulheres satisfaz-se com pénis pequenos ou médios, como principalmente, preferem homens que saibam usá-los. O maior prazer da mulher está no clítoris e não na vagina. Dessa forma, estimular todo o corpo da mulher, com ênfase no clítoris, prolongar ao máximo o período de carícias e retardar a penetração são excelentes “dicas” para uma relação sexual bem sucedida e prazenteira. É disso que elas gostam. E não de pénis grande.» Ou seja, quaisquer 30 cm chegam perfeitamente, acrescentei eu.

Beijos, beijos. Até à próxima