quinta-feira, 1 de maio de 2008

"CRIME EM LINDA-A-VELHA CITY" - CAPÍTULO 12

CAPÍTULO 12
AGORA É QUE ENTRAMOS NOS COPOS E NAS GAJAS

“Para manter a forma, nem pilates nem ioga.
Acho o sexo muito mais saudável.”
Sharon Stone

Ainda se recordam que JC teve a maior desilusão da sua vida quando, no capítulo 4, se deu conta de que não havia sequer resíduos de guito na carteira do Manny?
Desde essa altura e após sete capítulos, o leitor terá alguma curiosidade em conhecer as actividades de que se ocupou JC.
Não? Mesmo assim eu conto!
Depois de sair do estado de estupor catatónico em que caiu, alheio a quaisquer estímulos exteriores, durante dois intermináveis dias, JC caiu na realidade e compreendeu, então, o verdadeiro significado de algo que havia lido em tempos: “O problema de ser pobre é que isso te ocupa o tempo todo”.
No terceiro dia, enquanto Deus se dedicava a criar o sol e a lua, JC ocupou-se de tarefas mais prosaicas.
Foi devolver a Kasawaki, recebendo de volta o cheque careca que havia passado, facto que não o eximiu de levar duas latadas dos Vasconcelos Brothers.
Encaminhou-se depois para o Mil e Uma Noites, um bar de Linda-a-Velha City, frequentado por intelectuais (todos forasteiros, porque, como é sabido, os habitantes daquela cidade não perdem tempo com cenas culturais) para queimar os últimos euros do seu subsídio de desemprego.
- Então meu amigo, o que é que vai ser? – pergunta o barman.
- Uma cervejola bem geladinha – responde JC.
- Cerveja? Cerveja? Só por cima do meu cadáver. A cerveja não é álcool, por amor de Deus. Alguma vez bebeu cerveja e se sentiu como se estivesse na posse dos segredos do mundo, se sentiu como se compreendesse o amor, a arte e a música? É claro que não. A cerveja só serve para curar uma ressaca, mais nada.
- Só me faltava isto! O barman deste antro infecto a citar Boris Sterling - resmunga JC – Então venha de lá uma vodka.
- Estou a ver que o meu amigo conhece a obra em que baseei a minha tese de doutoramento em literatura inglesa do século XXI…
- Sem vodka não haveria hospitais, casamentos, baptizados, funerais, despedidas. Sem vodka, a amizade não seria amizade, a felicidade não seria felicidade. É o elixir da sociedade, o elixir que espalha o instinto gregário e o amor; também é um analgésico, sem o qual a vida seria intolerável. A vodka é a única droga capaz de fazer com que os desalojados consigam suportar os truques monstruosos que a vida lhes faz. A vodka é o único consolo dos homens e mulheres desesperados, para quem não existe outra libertação – cita de memória JC.
(Para estas merdas não tem o gajo lapsos de memória…).
- O meu amigo é um intelectual! Bem-vindo a esta catedral da cultura!
- Evidentemente. Estou desempregado, mas um dia ainda serei físico nuclear. E olhe que aquela moça é bem jeitosa…
- Boa opção, meu amigo. Como me confidenciou em tempos o professor Carvalho Rodrigues, aí sentado, nesse banco: “A fusão a frio nunca existirá, não é possível à temperatura ambiente dois átomos fundirem-se e libertar energia. A fusão nuclear, essa sim, terá de ser feita. Será a fonte energética para a Grande Viagem no Espaço”.
- Subscrevo integralmente… A tipa é um estrondo!
- E o meu amigo toma mais uma vodka?
- Venha ela, que a conversa está a dar-me uma sede do caneco.
- Aproveite, meu amigo, aproveite, pois como me disse há uns tempos o Vasco Graça Moura, sentado nesse banco aí ao lado de si, “não faltará quem tente instaurar uma nova lei seca na União Europeia. Tal como aconteceu com o tabaco, começa-se com a rotulagem das bebidas e depois vem o resto.”
- Esse rapaz é um bom filósofo – ironiza JC – e aquela rapariga tem tudo no sítio!
- Pois é, mas “os filósofos demitiram-se da ciência e limitam-se à análise da linguagem, não têm as chaves que lhe permitam entender e explicar o mundo”. Foi o médico e investigador António Coutinho, sentado ali ao fundo, que o disse ainda na noite passada.
- E com carradas de razão, porque, como afirmou Ernest Rutherford, “toda a ciência se resume à física, o resto são colecções de selos.” E gajas boas, digo eu!
- O meu amigo não se vá embora. Vou só anunciar a próxima rapariga e já volto para a conversa – pede o barman.
Alguns instantes depois, o barman regressa e sugere a JC que aprecie a qualidade artística da mais recente atracção importada da Ucrânia.
- Vou apreciar, sim senhor.
- Olhe que esta não faz nu integral, mas é muito jeitosa e o meu amigo não vai ficar a perder.
- Tatiana Bossanova, não é? Então venha de lá mais uma vodka!
A ucraniana Tatiana Bossanova já havia despido o casaco de peles, feito com 70 martas zibelinas, e dançava na pista ao som de “walk on the wild side”, de Lou Reed, revoluteando o seu corpo, banhado pelos focos de luz vermelha, de uma maneira sexualmente insinuante.
Tatiana avança indolentemente a passos seguros, mas pronunciados, nos seus sapatos de acrílico transparente, com saltos de de 15 centímetros, também cristalinos.
Sobe o seu atraente corpo, de um metro e 85 e 60 quilos, até ao topo da barra metálica, à força dos pulsos e dos músculos adutores das coxas.
Após um ligeiro impasse, mantém as pernas cruzadas em torno do varão, liberta as mãos e fica pendurada de cabeça para baixo, para depois se deixar deslizar vertiginosamente até atingir de novo o chão.
Afasta as pernas do varão cintilante e mantém-se deitada de costas na pista, põe as pernas no ar e faz rodopiar o seu corpo 90-63-90.
Levanta-se e caminha sensualmente sobre a superfície brilhante de acrílico, em movimentos lascivos, até à beira da pista, cantando em coro com Lou Reed:
“Holly came from Miami, F.L.A.Hitch-hiked her way across the USAPlucked her eyebrows on the wayShaved her legs and then he was a sheShe says, Hey babeTake a walk on the wild sideShe said, Hey honeyTake a walk on the wild side”
As suas mãos quentes percorrem, suave e eroticamente, o ventre,
os seios, o rabo, a zona genital, o interior das coxas, não deixando uma única zona erógena sem contacto.
Introduz os dedos por entre os seus longos e loiros cabelos ondulados, revelando na omoplata esquerda um conjunto de caracteres japoneses tatuados. Na outra extremidade do corpo, uma outra tatuagem, um golfinho azul, gravado perto do seu tornozelo direito.
Tatiana humedece o indicador direito nos lábios carnudos e escarlates e aponta para JC, que interrompe a 17ª vodka e a fita extasiado.
Lentamente, a showgirl ergue-se e eleva-se no ar. Quando os seus pés tocam o solo, logo afasta as longas pernas em extensão e executa uma perfeita espargata.
Põe-se de gatas e, mantendo sempre o olhar na plateia, desliza à volta da pista em movimentos felinos, como uma graciosa pantera à caça.
Levanta-se, de modo lânguido, e assenta as bem desenhadas costas em contacto com o frio varão de inox, onde efectua alguns movimentos ascendentes e descendentes de acentuada luxúria, exibindo umas pernas com músculos vigorosos, mas bem torneados.
Deixa-se então cair para a frente e leva as mãos ao solo, elevando e fazendo ondular as nádegas, que ostentam glúteos bem trabalhados. Na nádega direita pode ver-se uma borboleta tatuada.
Volta à posição vertical, aponta os seus olhos verdes na direcção de JC – que entorna a 18ª vodka – e, lentamente, introduz os dedos nas finas correntes do negro soutien de vinil, para, após alguns segundos, o desapertar e deixar deslizar ao longo do ventre até ao chão.
Ao mesmo tempo, com as duas mãos, cobre os seios, escondendo-os do olhar predador dos intelectuais dispersos pela sala.
Entreabre ligeiramente os dedos, para revelar uns mamilos túrgidos de excitação. Baixa o rosto e aflora-os com a língua húmida.
Mantendo a mão direita a encobrir os seios, faz deslizar suavemente a outra para a zona genital, percorrendo-a demoradamente, por cima do minúsculo fio-dental, desde o interior das coxas até ao umbigo, onde desponta um brilhante piercing azul indigo.
“Walk on the wild side” chega ao fim, tal como a 20ª vodka de JC. Tatiana percorre a sala com os seus exóticos olhos amendoados, atira um esvoaçante beijo a JC, recolhe as roupas do chão, em movimentos de estudada elegância, e retira-se para o camarim.
- Então, meu bom amigo, não acha que este mundo seria bem mais pacífico se o Einstein tivesse passado umas temporadas no Mil e Uma Noites, em vez de se meter no nuclear?
- Com efeito, aqui é que há bombas atómicas a sério… - comenta JC, antes de perder o equilíbrio e cair do banco.
Nesse intermezzo, naquele momento crítico em que o conhecimento vacila entre a semi-consciência e a inconsciência total, JC recordou Boris Sterling e os seus conselhos sobre como beber vodka sem cair na embriaguez.
“Primeiro, cheire a vodka, prove-a e fique com ela na boca durante alguns momentos. Depois, engula-a e coma qualquer coisa logo a seguir. Depois de cada dose, uma bebida mais fraca; a beleza sem a qual o animal não está completo…”
- O que completava agora este animal era um bife com batatas fritas e ovo a cavalo… - murmura JC já no limiar do estertor final.
TO BE CONTINUED…

3 comentários:

Fernando Bugalho disse...

Bem, para um bar intelectual, não está mal... (até rima); informo o exmo. autor que a sua novela começa lentamente, mas finalmente a ganhar algum interesse.

Aguardo com incontida ansiedade os próximos capítulos.

P.S. - Se o Jc devolveu a Kawasaki, como é que foi até ao bar ? Ou ainda havia lá na garagem dos Vasconcelos Brothers um carocha em 215ª mão, muito jeitoso ?

RJAM disse...

Apoiado, a novela está a tornar-se muito interessante para tipos intelectuais de esquerda como eu e o Bugalho.
Interrogo-me onde o autor se terá inspirado para descrever com tanta minucia e acerto os "movimientos sexy" da bela Ucraniana Tatiana(olha, também rimou). Concerteza em algum texto (sem fotos, claro) que estudou nas suas pesquisas pela Net.

MANUEL JESUS disse...

Informo os camaradas bloguistas que as cenas de strip são fruto da minha imaginação. Ou acham que eu frequento estabelecimentos ou sites intelectuais?